Descripción de la Exposición
Talvez a primeira coisa que chame atenção na exposição de Thais Beltrame seja o título. Primeiro as florestas, tem uma forte carga poética e desde o início dos tempos povoa os imaginários mais diversos, como de artistas, cientistas, escritores, ambientalistas, músicos e engenheiros, sob os mais variados aspectos.
Essa exposição começa em uma floresta. Em setembro de 2015, participando de uma residência artística, a artista passou 15 dias sozinha em uma casa no meio da mata, em Michigan, nos Estados Unidos, e durante esse período realizou uma série de desenhos de observação do que ia encontrando ao seu redor. Foi uma maneira de tentar enfrentar esse espaço misterioso, melancólico, localizado para além das paredes da casa onde estava. A dificuldade de estar em um lugar como aquele a fez pensar no início da melancolia na humanidade, que para muitos autores está ligado à separação entre linguagem e natureza.
Em Primeiro as florestas, Thais Beltrame reúne cerca de 30 trabalhos inéditos que nos levam para essa floresta. Os desenhos guardam em sua maioria a escala das nossas mãos. São acessíveis, próximos. São feitos a partir do ponto de vista de quem está dentro daquela paisagem. Ao mesmo tempo em que ela nos permite ver o que ela viu, também nos coloca na posição de construirmos nossa própria floresta. O caráter melancólico sobrevive nesses desenhos. Foi difícil para a artista estar lá e, agora, em certo sentido, também é difícil para nós.
Mas talvez o título chame atenção não só pela imagem da floresta que ele evoca. Antes mesmo de entrar no espaço expositivo, o espectador pode se ver intrigado pela vírgula que faz parte do título. "Primeiro as florestas,". Esse é um sinal de pontuação que funciona quase como um coringa. Mudar sua posição em uma frase pode significar alterar completamente o sentido, ou mesmo perdê-lo. É quase impossível prever o que vem depois dela: pode ser um complemento, uma reafirmação, uma ressalva, ou mesmo uma oposição à ideia inicial.
A dimensão lúdica sempre interessou Thais Beltrame e permanece presente em sua obra. Quando criança, a artista paulistana já desenhava, e mais tarde, já como artista, as crianças eram figuras constantes nas histórias e lugares construídos em seus trabalhos. Nesta exposição, as crianças já não aparecem como personagens, mas o aspecto lúdico da obra se mantém presente seja na maneira como lida com a imagem, como constrói as paisagens - que aqui deixam de ser cenário e começam a ocupar o lugar de personagens principais - ou mesmo como lida com o desenho em si. O corpo ainda se faz presente na obra da artista, não mais como figura. Se como dito anteriormente, agora nosso corpo é levado para dentro da obra, é corpo também o desenho que aqui é pensado como matéria. O que vemos são desenhos que, sim, partem da superfície bidimensional e dos traços feitos nessa superfície, mas vão além. Se valem também do uso da aquarela, da gravura e exploram diferentes superfícies, utilizando não só tipos variados de papel e incorporando outras materialidades.
Recortar - um dos verbos que vem sendo conjugados pela artista desde 2013 - é aliás uma ação importante nessa exposição. Aqui o desenho deixa de lado sua condição bidimensional e assume um caráter tridimensional. Em alguns casos são procedimentos simples, como o ato de dobrar a folha. Em outros há um processo quase escultórico de recorte, colagem e montagem. O resultado são desenhos em forma de instalações e objetos que lidam com o espaço real, que se valem inclusive a luz usada para iluminar a galeria, produzindo e incorporando sombras reais como parte da obra.
E esses são desenhos que lidam também com o tempo. É quase impossível olhar para alguns dos trabalhos e não pensar que estamos diante de em um rolo de filme ou um livro. Em alguns há uma insinuação de uma sequência enquanto em outros, o simples fato de colocar uma imagem do lado da outra nos instiga a tentar estabelecer uma relação entre elas. Dai nasce a possibilidade da narrativa - uma história que se desdobra no tempo. Algumas obras são livros de fato, inclusive com capa e contracapa, reforçando o interesse que a artista sempre revelou sobre o universo literário.
Em Primeiro as florestas, vemos diferentes possibilidades de construção de narrativas. E aqui, o grande personagem é o ato de desenhar.
Fernanda Lopes / Crítica de Arte
fev/2016
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