Descripción de la Exposición
O curso do sol
A exposição coletiva "O curso do sol" é organizada pela Gomide&Co em colaboração com o curador Yudi Rafael e o pesquisador e artista Roberto Okinaka. Reunindo cerca de quarenta artistas, a mostra deslinda narrativas da arte relacionadas à diáspora japonesa na América Latina. Para isso, reúne um recorte da produção de artistas nipo-diaspóricos ao lado de nomes latino-americanos cujas obras se entrelaçam com a cultura visual japonesa a partir de referências culturais e políticas locais.[1]
O curso do sol pode ser entendida como uma continuidade de uma série de exposições produzidas pela Gomide&Co dedicadas à discussão de temas afins à América Latina em paralelo à Bienal de São Paulo. Em 2018, foi apresentada a mostra Estratégias conceituais, cujo recorte exibia uma seleção de obras afiliadas à arte conceitual produzidas no continente sul-americano durante regimes ditatoriais. Já em 2021, foi realizada Nosso Norte é Sul, em que foi exposta uma coleção de peças têxteis ancestrais do período pré-colombiano em conversa com obras concretas, neoconcretas e contemporâneas provenientes do território latino-americano.
O curso do sol vem ao mundo em um momento histórico no qual os movimentos diaspóricos se tornam centrais para a compreensão do nosso turbulento presente. Ao mesmo tempo que vemos as fronteiras borradas por fluxos financeiros que desconhecem limites, os nacionalismos de cunho xenófobo se espraiam ao redor do globo, resultando em uma atualidade marcada pelo desejo regressivo de separação. Uma miríade de paisagens feitas de muros, grades e fronteiras vigiadas engendra um corte obtuso que diz: aqui, nós, lá, os outros. Essa comunhão por semelhança, por sua vez, traz consigo uma busca sectária guiada pelas ideias de pureza e de exclusão, das quais um dos sintomas é a repulsa à figura do estrangeiro.
É nesse contexto que a Gomide&Co, que em 2023 completa dez anos, devota especial atenção para o que as dinâmicas diaspóricas nos endereçam. Se por um lado nos parece fundamental singularizar as diferentes diásporas, pois estas sempre possuem características únicas, por outro certamente é possível traçar denominadores comuns. O ponto deflagrador de tais deslocamentos nos remete a situações violentas de conflito, como guerras e perseguições políticas, religiosas ou étnicas. Mas, enquanto nas suas origens tais fluxos evocam episódios macropolíticos, o que vemos na outra ponta, aquela que se dá com a chegada à nova terra, são consequências em diferentes aspectos da dimensão micropolítica da experiência. É a vida de cada um, em todo seu tecido mais prosaico, que será afetada pelo esgarçamento diaspórico. Moradia, trabalho, comida, amigos, clima, idioma, tudo que costura o cotidiano se vê abruptamente alterado. Abrupto também é o trânsito que transforma aqueles que chegam em grupo minoritário – rapidamente se passa à condição de outro. [2] Diante de tal contexto, muitas vezes traumático, são vários os processos postos em cena para que seja possível construir novos vínculos que possibilitem inaugurar uma outra vida.
Mas se é a existência de cada um que será modificada pelo corte diaspórico, toda possibilidade de restauro dos elos se dará coletivamente. Não por acaso, a noção de cultura será tão importante aqui. A etimologia da palavra cultura evoca o termo colo, que no latim quer dizer “eu moro, eu cultivo”. O gesto de cultivar junto, de forma gregária, no lugar de chegada torna-se, assim, seminal. Nesse sentido, vale recordar como a história dos artistas nipo-diaspóricos nos conduz até a força solidária da coletividade que marcou a trajetória do Seibi-Kai, um eixo fundamental de O curso do sol. Também conhecido como Grupo Seibi, foi uma associação artística fundada por Tomoo Handa em São Paulo, em 1935, pela qual passaram nomes como Manabu Mabe, Tomie Ohtake e Massao Okinaka. Ao lermos a ata de fundação do Seibi-Kai, encontramos o seguinte tópico: “estabelecer ligação com os pintores brasileiros ou de outras nações e com seus ateliês”. [3] Ou seja, o texto que exprime a missão original do grupo sublinha a importância de conexão com a alteridade, sinalizando para uma abertura à troca, à aliança, ao emaranhamento com aquilo que advém de fora e que, portanto, está a favor do que surge justamente a partir do encontro com a diferença.
Temos, assim, através do Seibi-Kai, um exemplo que afirma a importância de relações marcadas pela porosidade, lembrando como o campo da arte pode ser fértil no que toca a evocação de distintas maneiras de se constituir comunidades. No limite, podemos ver O curso do sol como um entrelaçamento de diversas vozes, diversas culturas, com vias à imaginação de um mundo mais polifônico e, portanto, mais solidário.
Luisa Duarte
[diretora artística Gomide&Co]
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Notas
[1] Para a escrita deste texto, foram importantes as conversas com a curadora Marilia Loureiro. Devo à nossa troca o caminho encontrado para esse texto. Indico a leitura de um texto de sua autoria: Captura e fuga: notas para imaginar espaços-refúgio. In: De montanhas submarinas o fogo faz ilhas. São Paulo: Pivô/ Kadist, 2022.
[2] Sobre o lugar do “outro” no debate atual da arte contemporânea e a importância de uma “des-outrização”, ver: Disothering as method (LEH ZO, A ME KE NDE ZA), de Bonaveture Soh Bejeng Ndikung. In: Catálogo da 21 Bienal Sesc Vídeo Brasil_Comunidades imaginadas, curadoria de Solange Farkas, Gabriel Bogossian, Luisa Duarte e Miguel López. São Paulo: Editora Sesc, 2019.
[3] Ver Paulo Roberto de Arruda Menezes, Grupo Seibi: o nascimento da pintura nipo-brasileira. Revista USP, n. 27, 1995. p 105.
Exposición. 17 dic de 2024 - 16 mar de 2025 / Museo Picasso Málaga / Málaga, España
Formación. 01 oct de 2024 - 04 abr de 2025 / PHotoEspaña / Madrid, España